Albert Frederick Arthur George (1895-1952), pai da atual rainha da Inglaterra, Elizabeth II, era o segundo na linha de sucessão do Rei George V (1865-1936), depois de seu irmão Edward (1894-1972). Sendo o caçula da Casa de Windsor, ninguém esperava que Albert assumisse o trono, o que aconteceu em 1936, quando o irmão, interessado muito mais em sua própria felicidade, abdicou. Mas o que faz um monarca quando, em um dos momentos mais dramáticos da história, é incapaz de dirigir-se ao povo sem gaguejar?
Com tema sisudo e roteiro centrado em diálogos, seria um filme classicista, não fosse o uso competente da linguagem cinematográfica para ajudar a contar as aflições do rei Albert. Hopper conta com a direção de fotografia de Danny Cohen, que enquadra o protagonista (Colin Firth) sempre nos cantos, em planos frontais, mas que beiram o plongée (de cima para baixo). Isso cria uma sensação de desconforto, evidenciando o sentimento de inadequação do monarca.
A câmera funciona igualmente bem para o outro lado da moeda, Lionel Logue (Geoffrey Rush), um inadequado de outro tipo - fonoaudiólogo que tem a tarefa de ensinar Albert a expressar-se com clareza. O embate de ideias (e educações) é fundamental ao filme e o trabalho de Cohen, que compreende também excelentes sequências de plano e contraplano, participa dele com firmeza.
Focados em suas tarefas, Colin Firth e Geoffrey Rush executam seus trabalhos de maneira inspirada. O primeiro dá ao rei a inconstância física e dualidade que o papel exige. Na vida íntima, com a esposa e filhas, surge terno e fala com fluidez reservada. Quando precisa desempenhar seu papel como nobre, porém, mantém a dignidade e o porte, mas gagueja de maneira dolorosa. Fica ainda mais evidente a qualidade do trabalho de Firth quando o vemos durante longas cenas ao lado de Geoffrey Rush. Lionel é um papel menos exigente o que poderia enterrar um trabalho menos competente. Se atuar é a arte de reagir, Firth e Rush engajam-se em suas reações como ninguém.
É também um alívio ver Helena Bonham Carter deixando de lado suas personagens estridentes para dedicar-se a uma mulher normal. A atriz interpreta a esposa de Albert com interesse. O elo fraco é mesmo Timothy Spall. Apesar de excelente ator ele dá um peso desnecessário às aparições de Winston Churchill. O general inglês era, sim, uma figura que parecia saída de um desenho, mas Spall se entregou às caras e bocas na oportunidade de interpretá-lo.
Hooper também é extremamente feliz na criação da atmosfera ameaçadora da Segunda Guerra. O grande antagonista do filme é o microfone - o inimigo a ser tornado aliado -, mas o eloquente Adolf Hitler também faz rápida aparição. A cena em que o Rei o observa discursando, franjinha em desalinho devido ao esforço teatral, é quase cômica.
Com o intuito de colher informações para escrever o filme, David Seidler, o octogenário roteirista, conta que procurou a Rainha Mãe, Elizabeth Bowes-Lyon (viúva do Rei George VI, morta em 2002), algumas décadas depois dos fatos. "Por favor, não o faça enquanto eu estiver viva. A memória desses eventos ainda é muito dolorosa", ela escreveu de volta.
Dolorosa ou não, a história não poderia ter sido contada de maneira mais elegante em O Discurso do Rei.
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