33. Vá ao Barbeiro
Estava andando à toa, sem direção. No caminho, passei em frente ao salão de barbeiro. Resolvi entrar. Logo fui recebido por um senhor, impecável em seu avental branco. "Então, jovem, o que vai ser hoje?", disse batendo com a toalha na cadeira de couro. Pedi para fazer a barba. Sentei. Sem saber, um ritual estava sendo iniciado. Primeiro veio o avental, depois a toalha, em seguida a conversa. "E o Passarela, cai ou não cai?" Com a cabeça, fiz um sinal positivo. "Para que time o senhor torce?", perguntou-me enquanto passava a espuma no meu rosto. Lembrei-me da primeira vez que surrupiei o aparelho de barbear do banheiro do meu pai e me pus a barbear. Devia ter 15 anos. "Tricolor", disse. E a conversa prosseguiu. Senti-me tomado por um sentimento nostálgico, uma lembrança daquela noite, em que me senti tão maduro. Temas dos mais variados foram tratados. Entre uma e outra história, apenas o som seco da navalha (acredite: é bom de ouvir). E assim fui voltando a condição imberbe de criança. "Tá pronto, ô pó-de-arroz", ouvi enquanto era benzido com aquela demão de talco de lata. Nessa hora tive a certeza de que aquele cheiro era atemporal. Mais: que representava o final do ritual. Levantei e paguei pela barba, pela conversa e pela terapia. Uma barganha.
Fernando Naigeborin
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